sexta-feira, 16 de dezembro de 2022

Seja Continuidade - Como?

 


Quem um dia não se sentiu fraco e ansioso diante de uma decisão na vida? 

Quem também não se sentiu igualmente ansioso diante de algo que precisava falar? 

Quem um dia se não se viu envolvida pelo medo da vida depois de uma perda, uma separação?

Quem um dia não teve a visita da decepção?

Quem um dia não teve medo do filho, da filha ou de ambos não se encaminharem na vida?

Todos nós temos um lado inseguro que nos leva a se ver pequeno para as caminhadas.

Como na obra de Cervantes, O Homem De La Mancha, somos um Sancho Pança, bom, meio atrapalhado e sem muita estrutura para as iniciativas. Através dos olhos fracos desse nosso lado, a visão da vida é meio assustadora. Esses olhos frágeis nos paralisam.

Sancho Pança, para trilhar caminhos desejantes, precisou ter a frente a maturidade e a audácia de Dom Quixote. Aliás, o fidalgo que se transforma no herói de La Mancha só se transformou em cavaleiro e defensor dos fracos aos quarenta anos. Nesta idade colocou sua armadura e foi realizar Sonhos que antes pareciam impossíveis.

Podemos ler esta obra como uma jornada de construção da capacidade de enfrentamento, que começa a se tornar mais visível aos quarenta anos. 

Não é mesmo assim a vida?

Parece que chega um momento em que a construção de um herói interior se faz imprescindível.

Como na mitologia grega, Aquiles faz sua jornada apesar e com seu calcanhar e Dom Quixote carrega atrás de si para onde for o nosso Sancho… Todos fazem sua jornada como nós devemos construir um modo de seguir, aonde nenhum avião, trem ou navio podem levar, pois não se trata de um caminho geográfico mas psicológico. Assim é o Natal, um símbolo de contínuo renascimento para se ingressar no Novo Ano constituído em si de um herói que nos conduza e nos salve das interrupções antes da vida nos interromper… 

Em cada situação um adequado, mas em todos algo em comum… Vencer os fantasmas… Vencer as mágoas… Vencer as culpas indevidas… As autossabotagens… Vencer tudo que nos torna vencidos… 

Ser uma pessoa vencida? 
É fazer que o próprio prazo de validade no existir seja vencido mesmo que continue a viver… 

Penso no menino que ao se tornar órfão de pai e mãe constroi um contorno Batman para fazer uma trajetória pessoal e ainda apoiar com isto a outros realizarem percursos.


De certa forma todos os heróis e todos nós perspectivadores do existir me fazem lembrar a Lenda Oriental da Borboleta Azul. 

Esta lenda conta que muitos anos atrás um homem ficou viúvo e teve que se responsabilizar por suas duas filhas.

As duas meninas eram muito curiosas, inteligentes e sempre tinham desejo de aprender. Constantemente lançavam perguntas ao pai para satisfazer a sua fome pelo saber. Às vezes seu pai conseguia responder com sabedoria, mas em muitos casos as perguntas de suas filhas o impediam de lhes dar uma resposta correta ou convincente.

Vendo a inquietação das duas meninas, ele decidiu enviá-las de férias para conviver e aprender com um sábio.

O sábio era capaz de responder a todas as perguntas que as pequenas lhe lançavam, sem sequer titubear.

Contudo, as duas irmãs decidiram fazer uma armadilha ao sábio para medir a sua sabedoria. Certa noite, ambas começaram a idealizar um plano: propor ao sábio uma pergunta que ele não fosse capaz de responder.

– Como poderemos testar o sábio? Qual pergunta poderíamos lhe fazer que ele não seria capaz de responder? – perguntou a irmã menor a mais velha.

– Espere aqui, já vou lhe mostrar – disse a mais velha.

A irmã mais velha saiu pelo morro e regressou após uma hora. Tinha o seu avental fechado feito um casaco, escondendo alguma coisa.

– O que você tem ai? – perguntou a irmã menor.

A irmã mais velha colocou sua mão no avental e mostrou à menina uma bela borboleta azul.

– Que maravilha! O que você vai fazer com ela?

– Esta será o nosso modo para fazermos a “pergunta-armadilha” ao mestre. Iremos procurá-lo e vou esconder esta borboleta na minha mão. Então perguntarei ao sábio se a borboleta que está na minha mão está viva ou morta. Se ele responder que está viva, apertarei a minha mão e a matarei. Se responder que está morta, a deixarei livre. Portanto, qualquer que seja a sua resposta, ela sempre estará errada.

Aceitando a proposta da irmã mais velha, as duas foram procurar o sábio.

– Mestre – disse a mais velha – Pode nos dizer se a borboleta que está na minha mão está viva ou morta?

O sábio respondeu com um sorriso maroto: “Depende de você, ela está nas suas mãos”.

O modo como seguramos nossa possibilidade de transcender faz com que nossa borboleta 🦋  interna se faça viva ou morta… 

A borboleta é um símbolo de internalização das ideias de capacitação para darmos a continuidade ao nosso existir nos contextos da vida…  

Esta lenda é muito significante para mim… Minha mãe sempre me dizia: “Quando rezar para mim com algum pedido: preste atenção na borboleta azul…”

Sabe que algumas delas já surgiram nos pátios do meu apartamento. A última vez uma voava tanto em torno de mim que cheguei a ficar aflito. E com certeza, enquanto escrevo esta crônica lanço meu olhar para este ano e vejo quantos heróis realizei em mim e por isto afirmo que borboletei algumas vezes para chegar aqui… 

É fato que o destino é indiferente a nós, mas fazemos a diferença diante da indiferença dele com nossos grandes recursos psíquicos… 

Viva nossos heróis internos!
Que 2023 seja uma bela jornada de herói para você!


Manoel Thomaz Carneiro
Psicanalista/Psicofísico
Créditos das Imagens: Patricia Secco (@patriciaseccoarte) 

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